A trajetória da UNICAMP até o primeiro web site em IPv6-only
29/05/2023

Por Henri Alves de Godoy – Computer Network Analyst | Professor Ph.D,- Universidade Estadual de Campinas
O ano de 2023 está sendo de muitas comemorações e avanços na área de redes de computadores. Estamos comemorando 40 anos desde que uma porção de hosts migrou para o protocolo TCP/IP em janeiro de 1983 [1]. Essa data foi a data final proposta por Jon Postel para migrarmos o protocolo NCP (Network Control Program) para um novo protocolo, o TCP/IP (Transfer Control Protocol / Internetwork Protocol).
Este ano também comemoramos os 25 anos desde a primeira especificação do protocolo IPv6, proposto na RFC 2460. Ainda, segundo uma pesquisa realizada em conjunto com o LACNIC [2], as projeções estatísticas indicam que os usuários da América Central seriam os primeiros a chegar em dezembro de 2023 a 51% da implantação do IPv6 em suas redes, alcançando um marco histórico.
Em 2012, com o World IPv6 Launch Day [3], fomos desafiados a implantar o IPv6 em nossas redes para experimentar o comportamento e o convívio de duas versões de protocolos (IPv4 e IPv6). A ansiedade e o receio de algo dar errado ou a possibilidade de algum controle de acesso falhar foram substituídos pela emoção de receber as primeiras visitas nos Web Sites da Universidade e os primeiros e-mails recebidos por meio de conexões IPv6.
Desde então, a forma mais comum para se começar a implantar o IPv6 está sendo através da entrega dos endereços em conjunto com o IPv4 (dual stack). Essa modalidade, apesar de ser a mais rápida e fácil, exige um trabalho dobrado por parte dos operadores de redes quanto ao gerenciamento e manutenção de duas versões de protocolos que convivem na mesma rede, além de outros fatores como:
- Dupla configuração de regras (ACLs), firewalls, tabelas de roteamento, endereçamento.
- Troubleshooting demorado e trabalhoso.
- Problemas com o IPv6 podem estar sendo mascarados (algoritmo happy eyeballs).
- Dependência ainda do IPv4 em algumas aplicações.
- Não resolve totalmente a escassez do IPv4.
O convívio prolongado do modelo dual stack amplamente difundido, nesse momento de transição para o IPv6, é preocupante no sentido de estarmos confortáveis a ponto de que se prolongue, cada vez mais, o uso do IPv4 e a sua dependência. Outro ponto a ser discutido, muito comum, é a possibilidade, por parte dos usuários, poderem desativar o IPv6 em seus desktops com sistemas operacionais Windows ou Linux, visando tentar resolver algum problema de conectividade ou simplesmente por alguma indicação de algum tutorial, ou amigo, iludidos de que a Internet poderia ficar mais rápida utilizando apenas IPv4.
Com o propósito de avançarmos e estarmos preparados para o futuro, além de demonstrar que o protocolo IPv6 é um bom negócio, a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) em março de 2023, migrou seu primeiro site institucional das Faculdades de Ciências Aplicadas de Limeira (FCA) [4] para trabalhar somente com o protocolo IPv6 no servidor onde as páginas web são hospedadas. Esse trabalho envolveu um planejamento desde as ferramentas utilizadas para hospedagem do Web Site, como o CMS (Content Management System) utilizado, banco de dados, conectividade com os repositórios de atualizações das distribuições Linux e seus pacotes até os sistemas de controle de acesso (ACLs), monitoramento, auditoria e registro de logs.
(Acesso livre, não requer assinatura)
A Universidade só conseguiu chegar a esse ponto de amadurecimento e confiança no protocolo IPv6 devido ao investimento em capacitação dos profissionais técnicos e os avanços nos estudos dos mecanismos de transição desde o NAT64, passando pelo 464XLAT e evoluindo finalmente até o SIIT-DC. Durante essa trajetória de aprendizagem, os cursos oferecidos pelo Campus LACNIC, Webinars e os eventos semestrais do LACNIC [5] (LACNOG, Fóruns Técnicos, Podcasts e Tutoriais) além também dos cursos e eventos do NIC.BR [6] (GTER/GTS, Intrarede, Camada 8, IX Fóruns e Semana da Infraestrutura da Internet no Brasil) foram essenciais e de extrema importância para capacitar toda equipe de profissionais da Unicamp desde aquelas que atuam no core da rede do Centro de Computação (CCUEC), os administradores de redes das diversas faculdades e institutos até os analistas de desenvolvimento e programadores.
Com isso começamos a construir e pensar em um Data Center somente com IPv6 na Universidade com o desejo que esse modelo sirva de incentivo e inspiração e que outras Faculdades, Institutos, Governos, ISPs e Empresas, sigam os mesmos passos. A tendência na Universidade agora é desenvolver uma cultura, entre os desenvolvedores de softwares e administradores de redes, para que novos serviços e Web Sites sejam configurados somente com endereços IPv6. Isso traz como vantagens:
- Evita a necessidade de migrar a aplicação novamente no futuro.
- Simplifica o gerenciamento dos serviços no Data Center.
- Reduz a complexidade de configurações duplicadas (IPv4/IPv6) nas aplicações.
- Otimiza a quantidade de endereços IPv4 no Data Center.
Mas o que acontece com os usuários que continuam somente em IPv4 e querem acessar diretamente os serviços do Web Site da Universidade? Uma maneira mágica e rápida de permitir esse acesso é utilizando o mecanismo chamado de SIIT-DC que realiza a tradução de endereços, sem estado, dos pacotes IPv4 para IPv6 e o seu retorno. O uso do mecanismo não requer mudanças drásticas na infraestrutura e topologia da rede. Apenas é adicionado um componente chamado Border Relay (BR) conforme podemos observar na Figura 1.
As opiniões expressas pelos autores deste blog são próprias e não refletem necessariamente as opiniões de LACNIC.
Conteúdo excelente