Projeto premiado por FRIDA busca reduzir o abuso e o assédio pela Internet
28/04/2016
O Centre of Leadership and Governance da Jamaica impulsiona um projeto para tentar reduzir a violência de gênero através do uso adequado das Tecnologias da Informação (TIC) na região do Caribe.
A iniciativa, que foi premiada pelo Fundo Regional para a Inovação Digital na América Latina e o Caribe (FRIDA) por sua contribuição com a promoção e exercício dos direitos humanos e das liberdades fundamentais na Internet, acaba de propor uma série de recomendações de políticas públicas para tentar reduzir a violência contra as mulheres.
Segundo a pesquisa, uma de cada 5 mulheres e meninas na Jamaica são vítimas de violência de gênero on-line.
O projeto, chamado “Violência contra a mulher e o uso de tecnologias da informação e comunicação na Jamaica”, analisou como são usadas as TIC em questões de violência de gênero.
Dhanaraj Thakur, responsável pelo Centre of Leadership and Governance e impulsora do projeto, disse a LACNIC NEWS que deve prestar-se especial atenção à gravidade da violência de gênero na Internet.
Como surgiu a ideia e como o projeto foi criado?
Ao longo dos anos eu encontrei na mídia da Jamaica diferentes relatórios sobre o assédio sexual on-line, em alguns casos envolvendo violência física. Isso me levou a querer saber qual seria o alcance destes incidentes e se o governo ou outras pessoas estariam tomando as medidas adequadas para resolvê-los. Do outro lado, também me deparei com a iniciativa Take Back the Tech (TBTT) da Associação para o Progresso das Comunicações e percebi que em nossa região poderia ser implementado um programa deste tipo. No entanto, o primeiro passo era compreender o problema no contexto da Jamaica e assim foi como nasceu este projeto de pesquisa.
Que relação você encontrou entre o uso da Internet e a violência contra meninas e mulheres na Jamaica e no Caribe?
Em primeiro lugar está o assédio e o abuso on-line. Os resultados do nosso estudo apontam que 1 em cada 5 pessoas na Jamaica tem sido vítima de assédio ou abuso on-line.
Em segundo lugar está a maneira como essas formas de abuso muitas vezes levam a enormes danos psicológicos ou atos de violência física fora da Internet. Por exemplo, pode acontecer que duas pessoas se conheçam on-line e depois uma delas seja enganada e submetida à violência sexual.
Em terceiro lugar está a forma em que as TIC são usadas nas relações de abuso. Em muitos desses casos, o abusador limita o acesso do abusado ao telefone ou ele o verifica constantemente para monitorar o que ele vem fazendo e com quem tem estado em contacto. Assim mesmo, costumam monitorar as atividades no Facebook.
Em nossa pesquisa nacional perguntamos às pessoas em que plataformas tinham experimentado abuso on-line. A resposta mais frequente foi no Facebook (quase 45%), seguido pelo Instagram, Twitter e salas de chat on-line. Em geral, a violência tinha ocorrido através das redes sociais.
Será que os atores sociais e políticos relevantes estão respondendo às recomendações de sua equipe sobre como usar melhor as TIC para reduzir a violência contra as mulheres?
Talvez seja muito cedo ainda para ver uma reação. Nós compartilhamos todas as nossas pesquisas e recomendações com grupos da sociedade civil, acadêmicos e, obviamente, com instituições governamentais. Vamos continuar promovendo as recomendações através de vários meios, incluindo este.
Quais são as suas recomendações? Existe alguma legislação a este respeito?
Nosso relatório inclui varias recomendações. Em primeiro lugar, afirmamos que, embora 1 em cada 5 pessoas na Jamaica foi vítima de abuso ou assédio on-line, há muito pouca sensibilidade para esta questão a nível do governo ou mesmo no seio da sociedade civil. Portanto, o primeiro passo seria reconhecer que o problema existe e que sem uma estratégia para enfrentá-lo irá continuar aumentando. Segundo e relacionado com o anterior, recomendamos a implementação de uma campanha nacional de sensibilização para educar os usuários sobre a realidade do abuso on-line e sua relação com a violência física. Esta campanha também pode incluir formação no uso das TIC para combater o abuso e a violência on-line (o programa TBTT que eu mencionei acima é um exemplo deste tipo de formação). Em terceiro lugar, deve haver um programa mais específico destinado a estudantes do ensino médio ou inclusive mais jovens para ensinar como se proteger enquanto está on-line e também como respeitar os outros. Em quarto lugar, constatamos que a maioria dos membros das igrejas jamaicanas são mulheres, de modo que esses locais seriam ideais para ajudar a educar e capacitar as mulheres e meninas sobre a natureza do abuso on-line. Além disso, isso também poderia ajudar a gerar uma discussão mais ampla acerca da violência contra as mulheres na Jamaica.
Quanto a recomendações sobre a legislação, embora não proponhamos novas leis, sim recomendamos preencher as lacunas nas leis existentes.
Por exemplo, a atual Lei de Crimes Sexuais não inclui adequadamente todas as formas de violência sexual, o que poderia debilitar qualquer tentativa de relacionar o abuso on-line com a violência. Além disso, a atual Lei de Crimes Cibernéticos não abrange o assédio nem o abuso on-line (embora sim observe os recursos contra o roubo de dados pessoais tais como imagens e vídeos). Finalmente, a política nacional de gênero também ignora o problema do abuso on-line e da violência sexual em geral. Nós defendemos que para abordar o problema é importante fazer referência aos vínculos existentes entre as TIC e a violência contra as mulheres e incluir estratégias para abordar estes e outros documentos legislativos e políticos.
Que tipo de intervenções pode ser feita na Internet para reduzir a violência de gênero no Caribe?
A maioria das plataformas mencionadas (de fato, a maioria das plataformas on-line) não tem sua sede no Caribe. Embora seja importante que as plataformas como o Facebook continuem trabalhando para reduzir o potencial do abuso on-line, as ações imediatas no Caribe devem se concentrar em melhorar o conhecimento e as habilidades para combater o abuso on-line.
Como você decidiu participar na chamada de FRIDA?
Obviamente a chamada de FRIDA incluía o Caribe, mas também incluía um componente de pesquisa que fez com que o programa fosse particularmente relevante para nosso projeto. Dada a oportunidade, decidimos enviar nossa proposta e tivemos a sorte de obter o apoio de FRIDA.
Como foi sua experiência como bolsista de FRIDA?
Nossa experiência foi excelente, já que a comunicação e a apresentação dos relatórios estiveram muito claras desde o início. FRIDA tomou cuidado de não recarregar a quem recebemos a bolsa com requisitos demais para a apresentação de relatórios, mas nunca parou de verificar que estivéssemos monitorando todas as atividades do projeto de forma eficaz.
Devido a que concentramos toda a nossa atenção sobre o projeto, uma coisa que ficou pendente foi aprender mais sobre os outros bolsistas. Na verdade, espero que no futuro, podamos envolver-nos mais com a comunidade de FRIDA em geral.