Brasil dobrou o número de usuários do IPv6 e é um dos líderes da região

27/03/2018

Brasil dobrou o número de usuários do IPv6 e é um dos líderes da região

O Brasil se tornou um dos principais países com implementação de IPv6 no mundo e está em nono lugar no ranking das nações com maior adoção do último protocolo da Internet.

De acordo com os números do NIC.br, o Brasil ainda neste ano vai chegar a 40% de usuários finais com IPv6, dobrando o número atual. O crescimento tem sido vertiginoso e em 2017 as estatísticas mostraram um crescimento de 100%.

Este sucesso, segundo Antônio M. Moreiras, gerente de projetos e desenvolvimento no NIC.br, é baseado em mais de 10 anos de treinamento da comunidade técnica no IPv6, e no trabalho de conscientização realizado com operadoras de acesso e serviços, empresas de telecomunicações, representantes do governo, fabricantes de equipamentos e universidades.

Moreiras acredita que os “verdadeiros culpados” dos atuais números do IPv6 no Brasil são os profissionais de inúmeros provedores de acesso que trabalharam duro para implementar o IPv6.

Quais você considera as chaves do sucesso do desenvolvimento vertiginoso que o IPv6 tomou no Brasil (hoje o nono do mundo em adoção do IPv6)?

Eu acredito que muitos fatores contribuíram para o desempenho do Brasil na adoção do IPv6. Um fator importante foi o trabalho que desenvolvemos no NIC.br, em várias frentes.

Uma dessas frentes foi a de divulgação e formação da comunidade técnica: há 10 anos, em 2008, lançamos o site IPv6.br, com artigos técnicos sobre IPv6, que em pouco tempo tornou-se referência sobre o assunto em língua portuguesa. Em seguida vieram os treinamentos presenciais, cursos de 32 a 40h/aula abrangendo teoria e prática, oferecidos de 2009 a 2016, gratuitamente, que formaram mais de 5000 profissionais, incluindo gente dos principais Sistemas Autônomos, de empresas relacionadas à Internet no Brasil, consultores e professores universitários. Lançamos também um livro didático: “Laboratório de IPv6” e oferecemos cursos IPv6 na modalidade EaD. Todo material didático que produzimos, inclusive o livro, foi licenciado em Creative Commons, permitindo a livre cópia, distribuição e reutilização. Realizamos palestras e tutoriais em inúmeros eventos técnicos, eventos de associações de ISPs e eventos acadêmicos. Também distribuímos o livro didático que escrevemos para bibliotecas de universidades, para incentivar sua adoção pelos professores. Organizamos ainda, de 2011 a 2015, um evento anual, o ‘Fórum Brasileiro de IPv6’, para discutir a questão. Todas essas ações aumentaram a compreensão, pela comunidade técnica, da necessidade da implantação do IPv6, e ao mesmo tempo deram subsídios técnicos para que ela fosse possível.

Outra frente importante no trabalho do NIC.br foram as reuniões de coordenação sobre IPv6 que organizamos aqui, principalmente no período entre 2011 e 2014. Elas envolveram o CGI.br, as associações de provedores de acesso, serviços e conteúdo, empresas de telecomunicações, representantes do governo, fabricantes de equipamentos, ANATEL, ministério público, polícia federal, bancos e outros participantes.

Essas reuniões foram um espaço importante para a conscientização da necessidade da implantação do IPv6, e nelas se debateram ações práticas, dificuldades, possíveis cronogramas, etc. O CGI.br contribuiu de forma direta e significativa publicando algumas recomendações sobre a implantação do IPv6, com destaque para as resoluções CGI.br/RES/2012/007/P, CGI.br/RES/2013/033 e CGI.br/RES/2014/008.

Obviamente o trabalho do NIC.br não foi o único responsável pelo bom desempenho do Brasil, mas gosto de pensar que tenha contribuído, facilitando e incentivando o processo. Os verdadeiros responsáveis são os profissionais de inúmeros provedores de acesso, que conscientes da necessidade da implantação do IPv6, vestiram a camisa desta causa, arregaçaram as mangas, e trabalharam duramente para fazer isso acontecer.

O fato de o Brasil ter várias operadoras de telefonia oferecendo o IPv6, pode ser um dos pilares desse crescimento?

Hoje o Brasil conta com mais de 5600 Sistemas Autônomos. O número estimado de provedores de acesso à Internet é ainda maior. Contudo, o mercado de provimento de acesso no Brasil é bastante concentrado. As grandes operadoras de telecomunicações são hoje nossos principais provedores de acesso à Internet, tanto na modalidade de acesso fixo, como móvel, atendendo a uma porcentagem considerável dos usuários. A ANATEL, nossa agência reguladora para telecomunicações, bem como as principais operadoras, representadas pelo Sinditelebrasil, participaram ativamente das reuniões de coordenação promovidas pelo NIC.br entre 2011 e 2014. Em 2014 a ANATEL tomou para si a tarefa de obter um cronograma de consenso do setor, convocando as operadoras para um diálogo. Estas comprometeram-se a iniciar uma implantação gradual do IPv6 para os usuários à partir de 2015 e assim o fizeram.Embora alguns provedores regionais tenham sido pioneiros e começado a implantação do IPv6 muito antes disso, foi à partir de 2015, com o comprometimento e trabalho sério das grandes operadoras de telecomunicações, que atuam aqui no Brasil também como grandes provedores de acesso, que começamos a ver os indicadores mostrando um crescimento expressivo. Merecem certamente um grande destaque a NET e a VIVO, que têm feito um trabalho de excelência e de liderança na implantação do IPv6.

Como essa implementação do IPv6 impactou o desenvolvimento da Internet e do setor de telecomunicações no Brasil?

Eu não diria que há uma relação causal. Não posso dizer que a implantação do IPv6 em si tenha incentivado o desenvolvimento da Internet. Mas há, sim, uma relação. Hoje o Brasil conta com mais de 5600 Sistemas Autônomos. Em 2008 eram menos de 500. O processo de crescimento e amadurecimento da infraestrutura da Internet no país vem acontecendo simultaneamente ao processo de conscientização e de implantação do IPv6.Estão claramente interligados. O NIC.br, em todas as ações em prol do IPv6, sempre tratou também de outros temas, como por exemplo, segurança, a importância do BGP e dos Sistemas Autônomos, PTTs, etc. Uma das formas pelas quais o processo de implantação IPv6 contribuiu, então, foi que durante o processo de conscientização e formação sobre o IPv6, se melhorou a compreensão da comunidade técnica sobre outros temas muito importantes para a infraestrutura da Internet.

Os provedores de conteúdo do Brasil começaram a implementar conteúdo no IPv6? Têm experiência nesse sentido?

Sim, de fato, os principais provedores de conteúdo aqui no Brasil, como aconteceu no cenário internacional, iniciaram o processo de implantação do IPv6 antes dos provedores de acesso.Em 2012, inspirados no World IPv6 Day, que havia se realizado em 8 de junho de 2011, organizamos a “Semana IPv6”, que contou inclusive com apoio do LACNIC e da Internet Society. A iniciativa tomou carona em um grande evento de tecnologia, inovação, entretenimento e cultura, realizado entre 6 e 12 de fevereiro de 2012, a “Campus Party Brasil”.Enquanto na Campus Party a Telefônica (agora Vivo) provia IPv6 para os participantes, os principais portais brasileiros, incluindo a Globo.com, Terra, UOL e iG, além de universidades como a Universidade de São Paulo, ativaram IPv6 em seus sites. Alguns deles mantiveram o IPv6 ativo à partir da data. Foi um marco.Vale a pena também destacar um ótimo trabalho realizado pela FEBRABAN, a associação dos bancos brasileiros. Desde 2013 criaram um grupo de trabalho para incentivar a implantação de IPv6 nos bancos, que já deu bons resultados, como por exemplo, a implantação do IPv6 nos sites do Bradesco, Banco do Brasil e Banrisul.A maior parte dos sites do governo e de comércio eletrônico ainda não funcionam com IPv6 hoje, mas há algumas movimentações importantes, por exemplo o governo do estado brasileiro do Ceará, que desde 2013 tem seus sites com IPv6. Acredito que seja apenas uma questão de tempo para termos resultados melhores também nesses setores.

De acordo com dados do Google para fevereiro deste ano, 23.6% dos usuários brasileiros da Internet acessam usando IPv6 e, segundo a Akamai, o tráfego IPv6 no Brasil cresce a taxas acima de 50% ao ano.
 Com base nestas informações estatísticas,  que expectativas de crescimento têm para este ano?

As estatísticas mostram que em 2017 o número de usuários com IPv6 quase dobrou. Com base nos números de janeiro e fevereiro, acho que podemos ser otimistas e esperar que isso se repita em 2018. Chegaremos ao final do ano com cerca de 40% dos usuários com IPv6.Temos ainda alguns grandes desafios, que precisam ir sendo superados, para mantermos o ritmo de crescimento do IPv6 e da Internet em si:aumentar o ritmo da implementação do IPv6 nos milhares de provedores regionais, em particular os menores; ter todos os provedores de hospedagem web, serviços de cloud, etc, com IPv6; garantir que todos os roteadores wifi domésticos e outras CPE disponíveis no mercado tenham todos suporte a IPv6; garantir que odutos conectados, como televisões, câmeras de segurança, etc, tenham suporte a IPv6; entre outros. Mas estamos indo bem. Vamos chegar lá.

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